quinta-feira, 27 de março de 2014

Carta 25 - FINAL

30 de Flamerule de 1374

Tholenburg, destino Mestre Castelão do Forte das Armas, Torre do Machado.
  • Caro Mestre Castelão:

Com esta, eu me despeço de minha jornada. Rompo meus laços, uma vez que cumpri minha obrigação. Mas o mundo é muito grande, e, a despeito de minhas intenções iniciais, acabo seguindo o mesmo destino dos Viajantes do Forte das Armas que me antecederam: Não mais retornarei.
Tudo mudou como os humores de uma raposa desequilibrada no dorso de um dragão azul. Bem, soou poético, não? Deve ser as novas companhias que estou precisando manter.

 Por meses a fio, a “serviço” dos Harpistas, eu vi como os poderosos do mundo tratam as ameaças. Admirei um pouco, fiquei enjoado em outros aspectos. Mas o que eu poderia fazer? Era um mero aventureiro que entrava em masmorras e espantava os monstros e vilões.

Se não me engano, em nossa última carta falava da Traição de Faelar. Mas já estávamos no encalço do traiçoeiro Yohan e da tomada definitiva do Portal de Vorbyx, no coração das cavernas dos ogros. Àquele tempo (de nossa primeira incursão por aquelas cavernas), meus companheiros não tinham meios suficiente para a missão, e ao menos tiramos das mãos dos monstros o Martelo de Vorbyx, chave para a livre movimentação ao redor do Mar da Lua, sob escusa de “investigarmos” para o então regente.

O Pântano não permite pontos de observação muito abundantes. Por isso, ficamos no último platô afastado da fortificação das bestas. Objetivávamos uma melhor forma de confronto, e se os inimigos não estivessem cientes de antemão, melhor. Analisando nossas habilidades, concluímos que Aravilar era o melhor capacitado para servir de batedor. No começo, comemoramos não precisarmos do inconsistente Solomon... Mas em breve nos arrependeríamos disso.

Aravilar partiu em sigilo e logo, sumiu de nossas vistas. Não poderíamos nos expor sem por sua vida em perigo... Então, apenas confiamos que caso o pior acontecesse, escutaríamos o escarcéu e partiríamos para o combate. Nyn preparava proteções contra flechas, sua namorada transformista cuidaria de explosões em área, coberta(o) por Sebastian. Eu e Gatz assumiríamos a frente. Tomar o muro era essencial, na nossa clássica estratégia de diminuir a vantagem numérica. Como percebemos na Torre de vigilância, eu era mais apropriado contra vilões como os ogros, mas o grandalhão cuidaria de batedores e apoio dos orcs e cobriria meu flanco. Com sorte, Aravilar poderia aproveitar manobras como Faelar fazia conosco.

Claro, nada disso foi para a frente. A narração foi mais para mostrar que eu era o senhor de meu destino. Nós tínhamos um plano de ação, e grande prática para ter sucesso e expulsar os desgraçados do forte... Mas um verme traiçoeiro e duas-caras interferiu e mudou tudo.

Sem nenhum sinal de Aravilar, ouvimos de imediato a Turba. Dezenas de orcs seguindo uma meia dúzia de ogros corriam em disparada na direção de nosso esconderijo. Deduzimos que o elfo havia sido descoberto e – sob tortura ou magia – nos denunciou. 

Estávamos em uma situação complicada. Mas não ao todo. Se tivessem um único cérebro militar, eles nos cercariam e massacrariam os nossos mais fracos. Mas os monstros confiavam tanto em seu tamanho e números que nunca precisaram aprender estratégia.

No primeiro momento, os vermes chocaram-se comigo. Encontraram mais do que poderiam rebocar. O pouco que tivemos de preparativo nos imunizou contra as flechas traiçoeiras dos arqueiros, e com Nyn e Richard e seus ataques em área, (“susto” no caso do clérigo. Usava alguma magia de medo) os números minguavam rápido. Se conseguíssemos poupar nossos recursos, poderíamos seguir e tomar o Forte.

Mas não deu certo. Por causa do duas-caras traiçoeiro.

Faelar.

Suposições à parte, o maldito sabia que ilusões banais seriam desmascaradas. Eu só me martirizo porque o estilo de ambos os elfos eram consideravelmente similares. Deveria ter visto que Aravilar era o assassino traidor. Que tipo de favores macabros tornaram seu rosto permanentemente o de Aravilar? Como ele pode renovar todo o caríssimo equipamento que angariamos em aventura? Mas sem esperarmos, ele surgiu.

Detrás de nossas fileiras.

Ele poderia ter ido em Nyn. Mais que nosso suporte, ele nos mantinha em pé quando sangrávamos. Mas a perversão falou mais alto, e a espada do traidor vitimou primeiro Richards (Rika em estado masculino). Era óbvio que ele sabia o que estava fazendo... Ele eliminou as poderosas magias E quebrou o espírito de nosso bondoso infante.

Gatz talvez tivesse alguma chance... Mas era óbvio que quem mais aguentaria uma peleja com o elfo era eu. Mas estávamos longe, na linha de frente, cobrindo nossos colegas fracos fisicamente. Sem o suporte de Nyn e Richard, os ogros começaram a nos cercar. Eu decidi recuar a Sebastian e o abalado Nyn. O bárbaro, uma mula desembestada, não reposicionou e logo estava no chão, aos pés de três ogros.

Eu poderia resistir e levar uma dúzia antes de meu martelo cair. Mas não podia decidir por meus colegas. Assim, eu ergui o Martelo de Vorbyx em rendição e exigi falar com o líder. Foi uma visão aos meus inimigos, o que desenvolvi com um plano desesperado a ser exposto mais à frente.

Percebi que aquilo frustrou Faelar, pois os Ogros gostaram mais da vitória fácil do que do derramamento de sangue. Percebi então o que houve. Ainda disfarçado de Aravilar, o ninja fez um acordo com os bandidos. Ele sabia que tínhamos o Martelo de Vorbyx. Depois, soube que havia uma lenda de que se um ogro erguer o Malho, ele seria o novo rei do Thar. E ele não ousaria tentar ameaçar o acordo num momento de glória dos vermes.

Fomos levados solenemente até os portões do Forte. Devidamente desarmados. E enfim reencontramos o regente ogro Dagryg, que tomou o Martelo de Vorbyx para si, e ergueu-o acima de sua horrenda cabeça.

Então, a cabeça do Martelo soltou-se e caiu sobre sua cachola... Para horror de todos.

Vale lembrar, Mestre Castelão, que Faelar não era um explorador do Thar. Logo, ele não soube que o Martelo era composto de três peças. A cabeça e o Cabo estavam lá, mas sem o anel de junção, não adiantava nada.

E o paradeiro do anel? Estranhei que ninguém questionou um orc adormecido que deveria nos vigiar durante o trajeto.

Confusos, os orcs estavam certos que o Martelo era falso... E a informação que chegou a eles foi de Faelar. Logo, eles concluíram que o elfo traiçoeiro era um mentiroso. Bem, eles estavam certos, mas era mais “desinformação” que mentira daquela vez. Fomos levados para as catacumbas dos monstros.
Novamente seguimos pela parte habitação do forte, e seguimos pelo caminho ignorado na nossa primeira visita. Foi quando eu percebi a realidade do regime Dagryg. Ele escravizava tanto ogros quanto orcs em uma favela subterrânea imunda. De certa forma nós, prisioneiros e conspiradores, éramos melhores tratados do que sua própria gente. Era diferente de quando estivemos em Hillsfar, onde os humanos compartilhavam seu ódio às raças forasteiras com seu regente. 

Pois é. Meu bom pai me disse que às vezes é melhor pensar em seus inimigos como menos que gente.
Lá estávamos nas celas. Um ogro na vigília. Eu dividia uma cela com Nyn, Gatz, quase morto, numa minúscula com Sebastian, e do outro lado do corredor, Faelar. Parece que a hospitalidade dos ogros não era tão genial assim.

O ninja analisava as fechaduras... Mas não ia além disso. Sua escolha de carreira o tornava tão prisioneiro lá quanto nós. Eu olhava com interesse o olhar que Nyn, discretamente, dava para ele. O pequeno me impediu de cumprir a justiça do sangue várias vezes ao longo de nosso tempo juntos, mas agora ele estava envolvido. Afetado. Ele sabe o que as vítimas dos vermes que pegávamos sentiam quando um herói alheio às comoções não satisfazia sua vontade de retaliação.

Só Sebastian percebeu como eu estava tranquilo apesar de tudo o que nos acontecia. Bem, primeiro, nunca tive medo de ogro. Segundo, eu tinha um plano em andamento... Só quando o vigia caiu adormecido por um ferrão venenoso tudo veio ás claras. Rossal, nosso pseudo-dragão que se ocultava em minha mochila por semanas, trazia ao pescoço como um colar a peça faltante do Martelo de Vorbyx. E na boca, as chaves de nossas celas. Sim, o pequeno foi um covarde ao longo de nossas andanças, mas aprendeu algumas coisas conosco. E o fato de falar diretamente com nossos cérebros sem ser ouvido por ninguém o tornava uma vantagem tática inesperada!

Quando nos soltamos Nyn perguntou o que faríamos com Faelar. Estranho ele pensar nisso antes mesmo de curar Gatz. Eu deixei claro uma coisa:

- Se eu desse cabo dele... Seria rápido demais.

Nyn ainda tinha uma ou outra magia de medo, mais uma aura de silêncio.E o que mais ele tenha sacado de sua cachola despertada para o digno dever da retribuição. E Mystra o inspirou a descobrir que sim, alguém pode literalmente morrer de medo. Deve ter sido angustiante... Mas Faelar/Aravilar  não existia mais.

O Ogro só tinha uma espada larga consigo, de tamanho adequado apenas para Gatz. Faelar tinha uma pequena besta escondida, talvez para uma fuga ousada quando nós não estivéssemos olhando, que deveria servir para Sebastian. Eu? Descalço e desarmado? Ao menos fazia menos barulho sem minha preciosa armadura.

Rossal nos avisou que o arsenal era pesadamente vigiado, e lá a maioria de nossas armas estavam. Mas aquilo que parecia precioso foi levado para o Cofre do Rei, que era próximo ao selo onde entramos há muitos meses atrás. Deveríamos nos armar.

Encontramos dois orcs vagando no caminho, mas Gatz e Sebastian cuidaram deles antes que pudessem dar qualquer alarme. Daquele trecho em diante, eu e Nyn já tínhamos familiaridade. Passamos pelo Selo, que ainda estava aberto. Ouvíamos vozes e grunhidos das criaturas lá embaixo. Mas o bibelô de Jade estava lá, exposto. Quando removemos, a porta começou a fechar-se. Um sentinela, do outro lado, percebeu e tentou juntar seus companheiros para vir nos impedir, mas a porta fechou antes.

Na sala do tesouro, peças de ouro e armadura digna de um regente ogro, e joias diversas. Algumas porções que Nyn foi desvendar, mas nenhuma arma. Exceto uma...

As peças do martelo de Vorbyx.Claro, inútil como uma arma (aos olhos dos brutos), mas, se fosse de qualquer forma legítima, um tesouro... O maior dos pântanos do Thar.

Passei a montá-lo. Era um momento de satisfação tê-lo em mãos. Realizo agora que era a primeira vez que o Malho estava completo junto com o legado do Rei Vorbyx. E ironicamente, nas mãos de um anão, um inimigo jurado de sua espécie. Eu cogitei um momento se era verdade que aquele que empunhasse a arma seria o legítimo Rei do Thar... Se o fato de não ser um ogro valia de alguma coisa ou não.

Eu logo descobriria... Dagryg deu por falta de seus batedores e ao encontrar o selo fechado, deduziu o que acontecia. Ele e dois soldados ogros aliados surgiram na porta do cofre enquanto eu terminava de montar o Martelo. 

Gatz estava de 2x0 em combates com ogros, e certamente queria começar a reverter o escore. Um dos guardiões do rei adiantou-se e seu choque particular começou. Sebastian não chegaria perto dos monstros, e só tinha uma besta pequena. Nyn tinha gasto muito de sua magia até então, procurou concentrar-se em curas para manter seus aliados.

O regente Dagryg, coitado, decidiu medir forças com o Flagelo de Vorbyx em pessoa.

Vale dizer que Dagryg era o regente por força. O maior dos ogros daquele forte. De meu lado, estava sem armadura ou escudo. Quando me postei irredutível, era minha carne contra sua clava cheia de espinhos e cravos. Ele golpeou primeiro e viu meu sangue. Usou seu alcance privilegiado para evitar meu primeiro assalto... Mas com isso, colou as costas na parede imediatamente atrás de si. E eu investi... Era tudo ou nada.

Dentro de sua defesa, clamei a Postura dos Defensores anões. Tornei-me uma muralha viva, e o ogro não poderia recuar mais. E enfim, renovado meu espírito de luta, girei o Martelo no ar. E o Urro de Vorbyx, que até então só havia visto em mãos de outros, ecoou. Era o Estondro sônico quando o Golpe era acertado de forma perfeita.

O Regente urrou de dor. Arriou de joelhos diante do Anão da Torre do Martelo. Eu pude ver medo nos olhos dele. Eu tinha menos de um terço do tamanho de Dagryg, mas para o ogro, naquele momento, eu era um titã.

Eu não era o Flagelo de Vorbyx... Era seu herdeiro! O Rei dos Ogros ajoelhou-se e pediu perdão jurando vassalagem Seus protetores acompanharam.

Que o Martelo só funcionou comigo por conta de uma trapaça, e que o poder invocado era uma aleatória... Nada disso era de conhecimento de Dagryg, ou dos orcs. Somente que um anão encontrou o martelo, e que um anão o fazia funcionar. Um anão ergueu-se diante do legado de Vorbyx. Então, um Anão seria o Rei do Thar!

E viva o coquetel de ignorância com lendas obtusas de um povo simplório.

Agora que eu era regente do Thar tinha uma escolha a fazer. Aquela aldeia merecia ser mais bem administrada do que por um cretino com sede de poder como Dagryg. Depois, outras tribos poderiam questionar a lenda... Seus regentes deveriam ser tomados. E enfim, os povos ao redor do pântano ainda tinham os assaltos dos orcs e ogros como problema constante. E eu poderia resolver isso.

Foram meses de disputas, mas com duelos um-a-um (desta vez devidamente armado), eu unifiquei as tribos sob uma única bandeira, a de Tholenburg (como rebatizei o forte e a posterior capital do Thar). Como uma nação, mandei emissários (muito bom poder usar livremente os portais de Vorbyx). Com as cidades vizinhas, acertamos um imposto por travessar nossas fronteiras, em troca, nossos servos auxiliariam na caça de outros monstros errantes e banindo bandidos. Outros como Hillsfar, praticamente impus um acordo. O Portal permitia que meu exército colasse em suas muralhas quando quiséssemos, e o tesouro me permitiu armá-los apropriadamente.

Infelizmente, nossa suposição que os portais levariam até o Forte Zhent eram infundadas. Mas com o Thar unido, éramos mais um inimigo potencial.

Eu bani os Harpistas. Nenhuma punição mais grave fora a escolta para além das fronteiras... Mas decidi optar por aliados menos duas-caras em meus negócios. Ao longo dos últimos dias falam que personalidades de minhas terras são ligadas em segredo aos Harpistas... Bem, se eles não se expuserem ou me incomodarem, que seja. Mas se precisar cumprir minha palavra, eu a cumprirei.

A fortuna que Vorbyx acumulou e que Dagryg sequer sabia como gastar foi bem usada. Equipei meu exército (até uma jugernaute voadora adquiri). Mas busquei nas cidades vizinhas engenheiros, mestres e druidas capazes de começar a dar forma às aldeias e permitir plantio nos pântanos. Gastei muito dela, mas soube que o sistema de Portais - meu trunfo para mover tropas e tesouros - custou pelo menos três vezes mais.

Sobre os meus aliados:

  • Gatz só queria aplicar magia na sua arma... Ele voltou a suas andanças. Ouvi dizer que ele foi a Águas Profundas.
  • Nyn aprendeu o que é a perda e o que é a responsabilidade. Então, soube depois, ressuscitou Rika/Richards e se casou com ele(ou ela... Ou eles) em Lua Argenta. Não ouvi nada sobre a cura da maldição... Vai ver eles se acertaram. Elfos, meu caro Mestre.
  • Sebastian foi banido (minha lei dos Harpistas) e se assentou em Elventree. Mas sua participação calada na libertação do Thar o tornou famoso dentre os seus. Bom para ele.
  • Aravilar/Faelar Permaneceu morto. Seu crânio foi enviado para uma ordem de assassinos em Lua Argenta de quem ele fugia. Seu líder ficou satisfeito com a notícia, e disse que se eu precisasse que retribuísse o favor, era só pedir. Não que eu precise de qualquer um para matar meus desagrados... Mas nem sempre poderei sair de meu trono.
  • Johan? Como um rei piedoso, eu o enviei para Melveaunt. Deixei que outros frustrarem suas vinganças sobre ele agora que não havia mais companhia de assaltantes lhe cobrindo. Eu pessoalmente estava tão acima disso, não concorda, meu senhor?


E eu, Tholen I do Thar, herdeiro de Vorbyx... Sinto-me desconfortável. Tive bons mestres no que tange honra e justiça, e as leis da guerra e da paz. Mas como regente, sou necessário aqui, do outro lado do mundo. Meus portais não chegam nem perto da Torre do martelo, ou do Forte das Armas, ou sequer da Cordilheira da Espada. E por isso, creio que esta seja a minha última carta, Mestre Castelão.

Sou justo com meu povo, e mesmo não gostando de orcs e ogros, a eles nada falta do básico. Mesmo em termos de batalhas... Nisso, os anões e os gigantes são muito parecidos, e temos um enorme pântano para colonizar e civilizar.

Que nossos escribas atualizem o mapa do continente com a nova nação, e que saibam que estas fronteiras são abertas a qualquer uma das Torres, e uma audiência com Tholen I seria uma prioridade de estado. Governo gigantes assenhorado pela sabedoria de maiores, como o senhor e meu honrado pai.

Que o Forte das Armas e o Estado do Thar cresçam e prosperem.
Tholen I do Thar, Outrora Tholen da Torre do Martelo. Eterno Servo do Forte das Armas.
________
~The End~

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